Gritaria: Quando a Voz Alta Revela um Coração em Desordem
📖 “Livrem-se de toda amargura, ira, cólera, gritaria, blasfêmia e de todo tipo de maldade.”
Efésios 4:31 (NVT)
Introdução: Um Barulho Que Não Vem do Céu
Estava trabalhando como motorista de Uber quando tive uma conversa daquelas que nos marcam. Levava um psicólogo social no banco de trás, e, ao passarmos por uma área bastante movimentada da cidade, fomos surpreendidos por um grito agudo e estridente vindo de um andarilho na calçada. Confesso: me assustei. Mas o mais curioso foi o que veio depois.
Aquele passageiro, com olhar atento e voz tranquila, comentou:
— Esse tipo de grito é mais comum do que parece entre os moradores de rua. Muitos deles gritam assim à noite, sozinhos, como forma de afastar perigos, intimidar possíveis agressores, ou até manter uma espécie de território. É um grito de defesa — adaptado à realidade dura das ruas.
Fiquei pensativo. Já tinha presenciado esse tipo de cena antes, mas nunca soube explicar. Era como se o grito fosse uma armadura sonora. Uma forma bruta e instintiva de sobrevivência.
Mas naquele momento, algo mais profundo me atingiu: Quantos de nós também aprendemos a gritar como defesa? Gritamos para impor respeito, para nos proteger da vergonha, para evitar que nos descubram frágeis. Usamos o volume como escudo. Alguns chamam isso de “temperamento forte”, outros de “jeito explosivo”. Mas a Palavra de Deus chama de pecado — e mais do que isso: um velho hábito do velho homem que precisa ser tirado.
Caros irmãos e irmãs, seguimos acampados nesse trecho precioso e prático da carta aos Efésios. Estamos trocando a velha roupa — a do velho homem — por vestes novas. E se você está chegando agora, este artigo faz parte de uma série que nasce de um livro em desenvolvimento, baseado na jornada espiritual de Romanos 6, 7 e 8, e culmina aqui, em Efésios 4 — onde aprendemos a nos vestir com o caráter de Cristo.
Hoje, nosso texto nos chama a atenção para um pecado que muitas vezes passa despercebido, camuflado como personalidade ou estilo de comunicação: a gritaria.
Assim como o andarilho grita para sobreviver, muitos de nós usamos o grito para dominar. Gritamos para vencer discussões, para calar o outro, para nos sentirmos no controle. Mas o grito não revela força — revela desordem. E, pior: ele entristece o Espírito Santo.
Você já parou para pensar que a Bíblia condena o tom de voz elevado, a fala descontrolada, carregada de raiva e barulho? Pois é. A “gritaria” de Efésios 4:31 não é apenas um som alto — é um sinal de um coração que perdeu o controle. São palavras cuspidas com violência, como se o volume justificasse a verdade. Mas para o Espírito Santo, isso não é só inaceitável — é doloroso.
O Que é “Gritaria” na Bíblia?
A palavra original usada aqui para "gritaria" (do grego kraugé) descreve berros de raiva, gritos furiosos, discursos barulhentos e descontrolados — o tipo de voz que emerge quando perdemos o governo de nós mesmos. Em Atos 23:9, o mesmo termo é usado para descrever uma comoção tumultuada entre os fariseus e saduceus. Não é apenas um tom alto, é um espírito desordeiro.
Esse tipo de explosão vocal é sempre sinal de algo mais profundo: um coração fervendo em conflito.
Por Que Isso Entristece o Espírito Santo?
Logo no versículo anterior (v.30), Paulo nos dá uma razão clara:
“Não entristeçam o Espírito Santo de Deus...”
Ou seja, a “gritaria” é uma evidência do velho homem, e quando o velho homem está gritando, o Espírito Santo está silenciando. Ele se entristece não porque é frágil, mas porque é santo — e habitar num corpo onde o som mais alto é a carne em ebulição é ofensivo à Sua presença.
O Espírito é gentil (Gálatas 5:23), paciente (1 Coríntios 13:4), e fala com uma voz mansa e suave (1 Reis 19:12). Ele se move onde reina a paz — não o barulho da carne.
O Que Isso Revela Sobre Nós?
Quando alguém vive gritando, especialmente com pessoas próximas, isso não é só um problema de temperamento — é um sinal de imaturidade espiritual, falta de domínio próprio (Gálatas 5:22–23) e muitas vezes um coração tomado de orgulho e autodefesa.
“A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura provoca a ira.” (Provérbios 15:1)
O grito não é só som — é uma arma. Usamos para intimidar, impor, vencer discussões. Mas quem está em Cristo não precisa vencer gritando — já foi vencido pelo amor de Deus. O volume não prova razão; muitas vezes, denuncia insegurança, raiva acumulada e desrespeito ao outro.
Outras Passagens que Reforçam Essa Verdade
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Tiago 1:19–20:
“Todos devem estar prontos para ouvir, mas demorarem para falar e irar-se. Pois a ira humana não produz a justiça de Deus.”
Onde há gritaria, a justiça de Deus foi substituída pela vingança humana.
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Provérbios 29:11:
“O tolo dá vazão à sua ira, mas o sábio a controla.”
Gritar é dar vazão. Dominar a voz é sinal de sabedoria.
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Eclesiastes 9:17:
“As palavras dos sábios, em silêncio, são ouvidas com mais atenção do que os gritos de um governante entre tolos.”
Nem autoridade espiritual se conquista com gritos. É o fruto do Espírito que conquista corações.
Um Convite à Substituição
A solução bíblica para o grito não é o silêncio vazio, mas a palavra que edifica (Efésios 4:29). Precisamos trocar o grito pela graça, o berro pela bênção, a acusação pelo acolhimento.
Isso exige mais do que autocontrole natural. Exige uma vida cheia do Espírito (Efésios 5:18), onde a voz do Céu se torna mais alta do que o grito da alma.
Conclusão
Gritar talvez nos faça sentir poderosos por um instante, mas deixa rastros de dor e quebra a ponte da comunhão. Em vez de gritar com as pessoas, gritemos com nossas almas:
“Por que estás abatida, ó minha alma?” (Salmo 42:5)
E, então, ouçamos a voz mansa do Espírito nos chamando de volta ao domínio do amor.
🛐
Ó Espírito Santo,
Vento suave que dissipa a tempestade da alma,
Voz mansa que cala os trovões da carne,
Fogo santo que consome sem destruir,Tu conheces os recantos do nosso ser,
E vês o que os outros só ouvem:
gritos que saem não da boca, mas de corações em guerra,
explosões não de coragem, mas de orgulho ferido.Perdoa-nos, Senhor,
por termos tratado a ira como temperamento,
o descontrole como sinceridade,
a gritaria como força.Temos levantado a voz quando deveríamos dobrar os joelhos,
ferido com palavras quando deveríamos ter curado com o silêncio,
procurado vencer discussões em vez de conquistar pelo amor.Ó Espírito de Cristo,
não apenas modifica nossa voz — transforma nosso coração.
Não apenas cala nossos lábios — domina nossas reações.
Arranca de nós o velho homem,
com sua cólera, sua pressa, seu desejo de ter razão.Dá-nos a beleza do fruto que Tu mesmo produces:
a brandura que desarma,
a paciência que espera,
o domínio próprio que honra Teu nome.Faz-nos tão cheios de Ti
que nossos lares se tornem lugares de paz,
nossas conversas canais de graça,
e nossas palavras, reflexos da Tua presença.Vem, Espírito de verdade,
fala mais alto que a alma ferida,
mais claro que a carne ferida,
mais doce que a ofensa recebida.Silencia em nós tudo o que entristece o Teu ser,
e acende em nós tudo o que alegra o Teu coração.
Em nome de Jesus,
que, em silêncio, venceu o mundo.
Amém.
Amém
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